Sobre a inserção das comunidades negras nas sociedades da América desde a escravidão
O livro Emancipação, Inclusão e Exclusão – Desafios do Passado e do Presente, que acaba de ser publicado pela Editora da USP (Edusp), reúne artigos sobre o processo de abolição da escravidão e a consequente inserção da comunidade negra nas sociedades do continente americano. Contando com textos de pesquisadores nacionais e internacionais e organizado em conjunto por Lilia Schwarcz e Maria Helena Machado, o trabalho é resultado da Conferência Internacional de Humanidades de 2013, ano que marcou os 150 anos da Proclamação da Emancipação nos Estados Unidos e os 125 anos da Lei Áurea no Brasil.
Foi para gerar reflexões sobre essas datas que aquela conferência, sediada na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo, abordou o tema que posteriormente deu nome ao livro. Como contam as autoras na apresentação da obra, foi discutida “a problemática das variadas emancipações ocorridas nas Américas, assim como suas consequências nas sociedades pós-escravistas”. A escrita segue o esquema dos seminários apresentados no evento: na primeira parte estão reunidos os trabalhos de convidados brasileiros e internacionais, e em seguida artigos de jovens pesquisadores de pós-graduação que trazem consigo novos ares para esse debate.
O primeiro segmento contém textos que discutem desde como ocorreram os processos de emancipação nos países americanos até o reflexo na atualidade do passado escravocrata em comum dessas nações. O norte-americano Eric Foner, por exemplo, no artigo “A Emancipação e seu legado nos Estados Unidos: de Lincoln a Obama”, traça um panorama sobre políticas públicas de inclusão nos Estados Unidos. Sua análise começa na Proclamação da Emancipação (1863), documento que, em meio à guerra civil, libertava todos os escravos que estivessem nos Estados confederados invadidos, e termina com críticas às políticas do governo de Barack Obama.
Apesar de terem sido escritos por acadêmicos ou ser resultado de pesquisas de pós-graduação, todos os textos apresentam uma linguagem acessível. “Polícia Militar e justiça criminal como promotoras de desigualdades”, escrito por Luiz Eduardo Soares, pode ser um exemplo deste caráter didático. No artigo, ele explica como funciona a Polícia Militar e sua ligação com o Exército brasileiro, mostrando como ela perpetua preconceitos existentes e abordando, por fim, a hoje tão falada desmilitarização da instituição.
Outro destaque do livro é a diversidade de abordagens dentro do tema principal, aspecto que fica claro principalmente na segunda parte da obra, que reúne trabalhos de alunos de pós-graduação. “O objetivo, quando eles apresentaram um balanço crítico de suas investigações – que foram comentadas por professores especialmente convidados para esse fim -, era justamente animar o espaço de reflexão com novos pesquisadores e divulgar os resultados de suas investigações”, escrevem as autoras.
Essa diversidade faz com que, na segunda parte do livro, alguns dos artigos tenham como pano de fundo estudos que se relacionam com o fazer artístico. Manuela da Costa, em “Participação política, identidade negra e projeções da memória nas músicas e crônicas de Manuel Tranquilino”, por exemplo, conta o papel de um músico da cidade de Cachoeira, no Recôncavo baiano, na luta pela abolição e na afirmação da identidade negra. Suas composições inspiraram encontros e atos dos militantes do período. Em perspectivas mais visuais, como no artigo “A segregação na forma: raça, gênero, sexualidade e corpo na cinematografia hollywoodiana e brasileira (1930-1950)”, Luis Felipe Kojima mostra como as leis antimiscigenação e as políticas de discriminação influenciaram na produção cinematográfica dos Estados Unidos, excluindo negros e negras. (Texto de Andre Romani, Fonte: Jornal da USP)
Emancipação, Inclusão e Exclusão – Desafios do Passado e do Presente, de Maria Helena Pereira Toledo Machado e Lilia Moritz Schwarcz (organizadoras), Editora da USP (Edusp), 400 páginas, R$ 68,00.