Quem vai proteger a sua privacidade na internet quando você morrer?

Quem vai proteger a sua privacidade na internet quando você morrer?

O conteúdo do acervo digital, que incluí fotografias, mensagens e conversas íntimas, pode ser exposto caso não haja precaução

A herança digital está entre os temas mais debatidos atualmente, em especial após a pandemia de covid-19, que afetou a sociedade nas mais diversas esferas e desencadeou um aumento da utilização das plataformas e ferramentas on-line. O Direito, que sofre direta influência das transformações sociais e históricas, apreendeu muitas das questões que guardam relação com a sucessão digital e que trazem em si dois temas frequentes nos últimos dois anos: a morte e a internet.

Apesar da importância da matéria, o Direito Brasileiro não conta com previsão legal que verse sobre ou regulamente a transmissibilidade do acervo digital após a morte do usuário. Também carece de previsão legal a destinação e o tratamento das informações que permanecem nas plataformas digitais após a morte do seu titular (como mensagens e fotos, por exemplo).

O advogado e sócio-fundador do Medina Guimarães Advogados, José Miguel Garcia Medina, explica que o denominado acervo digital é composto por tudo aquilo que compõe a atividade e utilização do usuário na internet, como, por exemplo, as redes sociais, arquivos em nuvem, plataformas de streaming, canais no YouTubesites, e-mails. Nesse contexto, a problemática sobre a morte do usuário passa não só pela mensuração e exploração econômica do conteúdo digital deixado pelo falecido, mas também pelas situações jurídicas existenciais decorrentes da sucessão.

“Com efeito, como discorrido na Constituição Federal Comentada de minha autoria, a privacidade e a intimidade da pessoa devem ser protegidas mesmo após sua morte. Pense-se, por exemplo, em mensagens íntimas trocadas entre usuários titulares de contas em rede social. Nesse caso, não se está diante de bem que integra a herança que, como tal, é transferida com a morte”, explica.

Recentemente, no âmbito do Juizado Especial Cível da Comarca de Santos (SP), foi concedido ao pai de um jovem falecido o direito de acessar os arquivos salvos na “nuvem” do celular pertencente ao falecido. Nos termos da sentença, proferida nos autos nº 1020052-31.2021.8.26.0562 de Tutela Antecipada Antecedente, publicada em 21 de janeiro de 2022, as circunstâncias que envolveram o caso estiveram devidamente comprovadas, restando claro o interesse de seus familiares no acesso aos dados armazenados por ele, notadamente fotos e outros arquivos de valor sentimental, como últimas lembranças. Também na decisão, foi utilizado como fundamento o fato de o requerente não ter deixado filhos, na ordem sucessória do artigo 1.829 do Código Civil, de forma que seus genitores passaram a ser seus legítimos herdeiros.

A advogada Mariana Barsaglia Pimentel, do mesmo escritório, explica que a decisão, apesar de levar em conta os anseios dos familiares em luto, não se debruçou sobre a vontade não manifestada do de cujus e sobre os direitos da personalidade do falecido, em especial sobre a sua privacidade e intimidade, que, geralmente, pertencem ao seu titular e não são transmissíveis aos herdeiros. Além disso, Joyceane Menezes, outra estudiosa da matéria, comenta que, no caso, deixou-se de considerar que, entre as fotos e vídeos constantes na nuvem, é possível haver arquivos enviados por terceiros ao falecido com a expectativa de que o acesso seria apenas de quem os recebeu.

A vontade dos usuários acerca do “destino” do acervo digital pode ser manifestada por meio de testamento ou codicilo, ou, ainda, perante as próprias plataformas digitais. A Apple, por exemplo, disponibiliza o recurso denominado “legado digital”, por meio do qual permite designar uma ou mais pessoas para serem “herdeiros digitais” com acesso à conta do iCloud (nuvem) em caso de falecimento do titular. Do mesmo modo, o Facebook permite que seus usuários escolham determinada pessoa para o gerenciamento da conta em caso de morte.

Em que pese as ferramentas disponíveis, são raros os casos daqueles que antecipadamente deliberam sobre a transmissibilidade do seu acervo digital após a sua morte.

A matéria aqui debatida não tem resolução ou resposta simples e comporta discussões que perpassam temas como proteção de memória da pessoa falecida, exploração econômica do acervo digital, sucessão de criptomoedas, entre outros. As questões que se colocam perante os operadores do Direito são muitas e demandarão um repensar sobre o Direito Sucessório e o Direito Digital como um todo.

Imagem em destaque: Crédito/Divulgação

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