
Foto Crédito: Tomaz Silva/Agência Brasil.
De acordo com o documento TIC Kids Online Brasil (levantamento realizado em 2024 pela UNESCO e o Cetic.br), 24,5 milhões de menores entre 9 e 17 anos têm acesso à internet no país, total que representa 93 por cento dos brasileiros nessa faixa de idade. Quase 30% desse total disseram ter passado por situações ofensivas no ambiente digital. Porém, apenas 31% relataram o que ocorreu para seus pais ou responsáveis, 29% contaram para um amigo da mesma idade, 17% se abriram para parentes próximos e 13% mantiveram segredo e não revelaram para ninguém o que as chateou ou ofendeu.
O estudo apontou que cerca de três em cada dez usuários de internet nessa faixa etária têm responsáveis que bloqueiam ou filtram alguns tipos de sites (34%); filtram aplicativos baixados (32%), limitam pessoas que entram em contato por chamadas de voz ou mensagens (32%); monitoram sites ou aplicativos acessados (31%); bloqueiam anúncios (28%); alertam sobre o desejo de se fazer compras em aplicativos (26%); e restringem o tempo na internet (24%).
“Assim como ensinamos nossas crianças a não falar com estranhos na rua, temos que agora ensiná-las a como se comportar na internet. Atualmente, pais e responsáveis devem trabalhar no letramento digital, supervisionando as atividades e ensinando dinâmicas mercadológicas, pois o uso inadequado da internet pode gerar um meio propício para o adoecimento físico e mental”, alerta em nota Valdir Gugiel, diretor do Centro Marista de Defesa da Infância e membro do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente de Santa Catarina.
Ele acrescenta que, atualmente, quando se trata de infância e juventude, é necessário promover um debate sobre o uso consciente de telas e dispositivos e a violência no ambiente digital.
Transição na Espanha
Se, no Brasil, esse debate ainda depende de uma maior conscientização do problema pelos pais e responsáveis, um grupo de 50 especialistas espanhóis, liderados por Ana Caballero, advogada especializada em tecnologia e vice-presidente da Associação Europeia para a Transição Digital – AETD (Asociación Europea para la Transición Digital, em espanhol), entregou em dezembro ao governo espanhol um relatório com orientações que visam ampliar a proteção de crianças e adolescentes nas plataformas on-line. Ao todo, o material é composto por 107 medidas e avalia as transformações que afetam diretamente os direitos, a proteção e o desenvolvimento integral da infância e da juventude.
O estudo, denominado “Relatório do Comitê de Especialistas para o Desenvolvimento de um Ambiente Digital Seguro para a Juventude e a Infância” avaliou diferentes faixas etárias e elencou as recomendações de acordo com a idade das crianças e adolescentes. A principal recomendação é que os menores tenham acesso restrito a dispositivos digitais até completarem 13 anos, para mitigar possíveis problemas de saúde pública.
Para crianças de até três anos, a recomendação é que não haja nenhum tipo de exposição a dispositivos digitais. Já para menores entre quatro e seis anos, a proposta é que o acesso aos meios digitais ocorra apenas em situações excepcionais. Para crianças entre seis e 12 anos, a sugestão é que seja priorizado o uso de telefones simples, que não têm acesso à internet e são limitados a chamadas – assim como a preferência por atividades que não utilizem as telas, como a prática de esportes.
Dos 12 aos 16 anos, se for decidido permitir o acesso a dispositivos digitais pelos pais ou responsáveis, a recomendação é adotar medidas de proteção, como a instalação de ferramentas de controle parental que permitam, dentro dos limites que essa tecnologia oferece, evitar o acesso a conteúdos inadequados, bem como gerenciar o tempo de exposição.
Outra proposta feita pelo grupo de especialistas é que o governo espanhol considere adicionar um rótulo de aviso nos dispositivos digitais vendidos na Espanha, informando os consumidores sobre os riscos à saúde provenientes do uso de redes sociais e dispositivos digitais, além dos possíveis impactos que o acesso a conteúdos inadequados pode ter no desenvolvimento das crianças.
De acordo com Ana Caballero, “é urgente a criação de uma regulação que proteja e traga mais segurança para as crianças e adolescentes no ambiente digital. Enquanto as leis não avançam, as famílias terão que adotar uma atitude mais proativa e controlar tudo o que está relacionado com a atividade de seus filhos na Internet”.
“As crianças já têm um celular próprio muito cedo, por isso é preciso protegê-las e educá-las para que alcancem uma autonomia digital e aprendam a identificar os riscos e ameaças”, completa a vice-presidente da Associação Europeia para a Transição Digital.
O grupo de especialistas que produziu o documento foi criado a partir de uma solicitação do Ministério da Juventude e Infância espanhol para propor as melhores medidas diante de um problema crescente: os impactos negativos da digitalização em crianças e adolescentes, com fenômenos como o ciberbullying, a comercialização de seus dados pessoais, problemas de saúde mental devido à exposição a redes sociais e o impacto em suas relações afetivas e sexuais como consequência da exposição a conteúdos pornográficos.