Dia da Consciência Negra: Movimento celebra a data desde 1978

Dia da Consciência Negra: Movimento celebra a data desde 1978
Foto Crédito: Marcelo Casal Jr/Agência Brasil

Na próxima segunda-feira, todos os brasileiros terão a oportunidade de, mais uma vez, refletir sobre o papel histórico dos negros em nossa sociedade e a população negra, em especial, terá a ocasião de tomar mais consciência do seu poder. O dia 20 de novembro passou a ser chamado de Dia da Consciência Negra depois que ativistas do Grupo Palmares, do Rio Grande do Sul, chegaram à conclusão de que Zumbi foi executado nesse dia. Sete anos depois (1978), o Movimento Negro Unificado incorporou a data como celebração nacional. Em 2003, a Lei 10.639, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, introduziu a data no calendário escolar brasileiro. O 20 de novembro foi instituído como data de referência para o movimento negro em contraposição ao 13 de maio, data em que foi decretada a abolição da escravatura pela princesa Isabel no ano de 1888 (Lei Áurea). O 13 de maio, então, celebra a generosidade branca em relação aos negros. Já o 20 de novembro celebra a própria luta dos negros por sua libertação.

As marcas da escravidão continuam presentes em nosso dia a dia. As consequências são muitas e vários são os negros que lutam pelo resgate de suas origens e pela valorização de seus iguais.

Origens perdidas

Djamila Ribeiro, professora, filósofa, jornalista e autora de vários livros sobre a negritude, chamou a atenção dos presentes à cerimônia em memória das vítimas da escravidão e do comércio de escravos realizada em março deste ano na sede da Organização das Nações Unidas, nos EUA. Na ocasião, Djamila afirmou que, como negra, não lhe foi dado o direito de saber de onde veio.

“Entre os negros, falando do contexto brasileiro, como a gente foi apartada da nossa identidade, isso dificultou muito que a gente se entendesse. Houve quase 300 anos de escravidão, depois queimam-se os documentos referentes à escravidão. Eu não sei, por exemplo, de onde meus antepassados vieram. Então, quando a gente não sabe de onde a gente veio, é muito mais fácil a gente ir para onde dizem que a gente tem que ir. Nós, como negros brasileiros, a gente tem esse buraco porque um descendente de italiano no Brasil, muitas vezes, ele sabe, descobre, tira a cidadania italiana. Eu queria poder tirar a cidadania não sei se de Gana, da Nigéria. Mas eu não sei de onde meus ancestrais vieram”, disse ela.

Terceira Idade

Valmir Moratelli, doutor em comunicação, vem estudando as consequências do racismo na terceira idade. O especialista, que trabalha com o termo “Afrovelhice”, mostra como na etapa mais avançada de suas vidas, os negros, que tiveram negados os acessos às mesmas condições que os demais, não conseguem usufruir de facilidades de bem-estar e acabam em situações ainda mais graves de vulnerabilidade. “A afrovelhice é caracterizada pelo aprofundamento de desigualdades enraizadas na sociedade brasileira”, explica. Moratelli também pesquisa sobre a representatividade de idosos na TV e no cinema e é enfático ao apontar que os idosos negros são mal representados com personagens sem contexto familiar e relevância nas tramas.

Pessoas “mais pretas” que outras

Janaína Bastos, doutora em educação, chama a atenção sobre como a percepção da cor da pele no Brasil, sobretudo dos pardos, varia conforme o contexto socioeconômico, cultural e geográfico. Assim, o indivíduo pode ser percebido como “mais para branco” ou “mais para negro”, dependendo da renda, da escolaridade, da cidade onde mora, do vestuário, dos hábitos e do linguajar. Ela explica que termos como “moreno claro”, “moreno escuro”, “escurinho” e “mulato” são popularmente utilizados para definir aqueles que não são totalmente percebidos nem como brancos nem como negros.

Nesse embate gerado pela ambiguidade dos tons de peles dos mestiços, o racismo se manifesta de forma cruel. Isso porque muitos optam pelo caminho da busca pelo branqueamento para evitar o preconceito. Daí decorre a negação de traços negroides, por meio da raspagem ou do alisamento dos cabelos, por exemplo, o ocultamento dos ancestrais negros e a identificação com valores da branquitude.

Saúde mental abalada

O índice de suicídio entre jovens negros é 45% maior do que entre brancos, segundo levantamento do Ministério da Saúde. Na faixa etária de 10 a 29 anos, a probabilidade chega a 50%. Esse dado alarmante é apenas um dos indicativos de que a população preta está mais vulnerável aos sofrimentos psicoemocionais. Para as pesquisadoras na área de saúde mental de pessoas negras, Bárbara Borges e Francinai Gomes, a resposta para tratar do problema está na adoção de estratégias de promoção de autoconhecimento e do fortalecimento do senso de comunidade. Elas defendem que a suposta neutralidade da escuta em psicologia reproduz violência e silenciamento. Para elas, é incabível que profissionais da área mantenham o posicionamento de que “sofrimento não escolhe raça” porque o pertencimento racial é fundamental para a estrutura da subjetividade, linguagem e posição no setting terapêutico.

Educação antirracista já

Já a comunicadora e ativista Alexandra Loras convida crianças e adultos a entenderem as atitudes racistas por meio de uma reflexão sobre a presença de negros no próprio dia a dia. Loras destaca que o diálogo racista acontece cotidianamente, sendo preciso investir em uma educação antirracista. Mas, como fazer isso? Começando pelos pequenos. Segundo ela, pais, educadores e toda a sociedade devem estimular diálogos sobre o preconceito e incentivar a conscientização desde cedo.

O racismo presente na nossa fala

Pensando nisso, especialistas alertam para a necessidade de se repensar o uso de termos e expressões que reforçam o racismo. Há casos em que essas palavras são reproduzidas sem que as pessoas tenham o conhecimento histórico da origem delas.

Para conscientizar sobre o tema, a Defensoria Pública da Bahia lançou o Dicionário de Expressões (Anti) Racistas, em novembro de 2021.

“Nosso idioma foi construído sob forte influência do período de escravização e muitas destas expressões seguem sendo usadas até hoje, ainda que de forma inconsciente ou não intencional. Precisamos repensar o uso de palavras e expressões que são frutos de uma construção racista”, destaca a publicação.

A cartilha cita expressões como “a coisa tá preta”, em que a cor preta ou negra é usada em uma conotação negativa, e propõe a substituição para “a situação está difícil”.

Outro exemplo de expressão considerada racista é “cabelo ruim” para designar cabelo crespo ou cacheado. A publicação também aponta as expressões “mercado negro, magia negra, humor negro e ovelha negra” – em que a palavra ‘negro’ representa algo pejorativo, prejudicial, ilegal. Como alternativa, propõe-se o uso de mercado clandestino, lista proibida e humor ácido.

“O racismo se revela de diversas formas em nossa sociedade. Estas microagressões, além de reproduzirem um discurso racista, ao identificarem a negritude como marcador de inferioridade social, afetam o bem-estar de pessoas negras”, diz a cartilha.

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