Amar pode ajudar a prevenir a osteoporose
Apesquisa ainda está em andamento. Mas especialistas da Universidade Estadual Paulista (Unesp) esperam que os resultados positivos até agora obtidos em laboratório possam valer também para os seres humanos. De acordo com eles, a ocitocina, substância liberada em presença de parceiros e por isso conhecida como “hormônio do amor”, pode ser uma forte aliada no controle e na prevenção da osteoporose. Isto porque estudo realizado em ratas no fim do período fértil mostrou que a ocitocina reverteu fatores que antecedem a osteoporose, como a diminuição da densidade e da resistência óssea.
“Nosso estudo tem como enfoque a prevenção da osteoporose primária. Por isso investigamos mecanismos fisiológicos que ocorrem no período pré-menopausa. Nessa etapa da vida da mulher, medidas de prevenção podem evitar que os ossos se tornem frágeis e que ocorram fraturas, o que poderia reduzir a qualidade e a expectativa de vida”, diz Rita Cássia Menegati Dornelles, uma das participantes do estudo. Dornelles coordena o Laboratório de Fisiologia Endócrina e Envelhecimento do Departamento de Ciências Básicas da Unesp de Araçatuba, município do interior do estado de São Paulo.
O perigo das fraturas nas mulheres
A importância da pesquisa tem a ver com projeções realizadas pela Organização Mundial de Saúde. A OMS estima que haverá um aumento de 630% das fraturas de quadril no Brasil, enquanto que nos países desenvolvidos o aumento esperado será de 50%. E essas fraturas de quadril estão associadas à osteoporose, além de incidirem mais nas mulheres do que nos homens, na proporção de 3 para 1. “O aumento está relacionado ao envelhecimento da população, que apresenta taxas crescentes de osteoporose em função de fatores como qualidade de vida, nutrição e atividade física, importantes na prevenção de doenças”, ressalta a pesquisadora.
Dornelles destaca que fraturas de quadril estão associadas a altas taxas de mortalidade. “Até 24% das pacientes morrem no primeiro ano após a fratura de quadril e o risco aumentado de morte pode persistir por pelo menos cinco anos. A perda de função e de independência entre os sobreviventes é profunda. Em torno de 40% ficam incapazes de andar de forma independente. Desse total, 60% necessitam de assistência um ano depois. Das pessoas que sobrevivem à fratura de quadril, menos da metade recupera seu nível anterior de função”.
Antes da menopausa
Dornelles explica que existem dois marcos hormonais importantes na vida da mulher: a puberdade e a perimenopausa (transição para a menopausa, que pode durar vários anos). Esses eventos marcam, respectivamente, o início e o término do período de fertilidade. “Estuda-se muito a pós-menopausa, quando a mulher deixa de menstruar. No entanto, as oscilações hormonais que ocorrem antes, na perimenopausa, já são bastante fortes e estão relacionadas com a diminuição gradual da densidade óssea. É preciso haver estudos visando a prevenção da osteoporose nessa fase, pois o período após a menopausa representa cerca de um terço da vida e deve ser vivido com qualidade” diz.
No estudo, os pesquisadores aplicaram duas doses do hormônio ocitocina – com 12 horas de diferença entre uma injeção e outra – em um grupo de 10 ratas Wistar. As fêmeas tinham 18 meses de vida, algo incomum para estudos de laboratório, pois as pesquisas geralmente são realizadas com animais jovens submetidas a ovariectomia. Em média, ratos de laboratório vivem cerca de três anos. As fêmeas do estudo estavam no período da periestropausa, que corresponde à perimenopausa humana, e em processo natural do envelhecimento.
Após 35 dias de tratamento com ocitocina, foram analisadas amostras de sangue e do colo do fêmur dos animais. Houve também comparação desses dados com os de outras 10 ratas, também com 18 meses de vida, que não receberam o hormônio.
Na comparação, os animais que receberam as doses de ocitocina apresentaram estrutura óssea sem sinais de osteopenia (perda de densidade óssea). O quadro foi diferente no grupo controle. “A ocitocina ajuda a modular o ciclo de remodelação óssea das ratas senescentes. Os animais que receberam o hormônio tiveram aumento dos marcadores bioquímicos associados à renovação do osso, como a expressão de proteínas que favorecem a formação e a mineralização óssea”, destaca a pesquisadora.
As ratas que receberam ocitocina apresentaram ossos mais densos. “Verificamos que a região do colo do fêmur estava mais resistente, com menor porosidade, melhor resposta biomecânica de compressão, além de apresentar propriedades físico-químicas que garantiam maior densidade”, diz.
Secretada no osso
A ocitocina é um hormônio produzido no hipotálamo cerebral e foi caracterizada no início do século passado tendo sua liberação associada, sobretudo, ao parto e à amamentação.
Estudos mais recentes mostraram que um número grande de células (além das hipotalâmicas) também secretam o hormônio. “A ocitocina é secretada por células ósseas e nossos estudos estão evidenciando sua associação com o metabolismo ósseo de fêmeas durante o processo de envelhecimento. Geralmente, mulheres no período pós-menopausa, com maior índice de osteoporose, apresentam concentrações mais baixas de ocitocina no plasma sanguíneo”, diz Dornelles.
O grupo de pesquisadores da Unesp trabalha há 10 anos em estudos sobre o envolvimento da ocitocina no metabolismo ósseo. “Nesse tempo conseguimos caracterizar modelos animais que simulam o período da perimenopausa na mulher”, diz.
A resposta vai demorar
Os pesquisadores pretendem realizar, no futuro, estudos clínicos sobre o efeito da ocitocina na prevenção de osteoporose em humanos. “O hormônio é produzido naturalmente no nosso organismo e já foi sintetizado em laboratório. Mesmo assim, será necessário um longo estudo para avaliar a eficácia, a segurança e também para saber a dosagem mais indicada do hormônio”, diz Dornelles.
O estudo recebeu apoio da FAPESP e foi publicado na Scientiflc Reports e pode ser lido em https://www.nature.com/articles/s41598-020-64683-0
Com informações de Maria Fernanda Ziegler/Agência FAPESP.