Eleições livres e democracia ficam ainda mais distantes no Sudão com disputa entre facções
Desde sábado, 15 de abril, intensos conflitos têm ocorrido entre as Forças Armadas Sudanesas (SAF) e as Forças de Apoio Rápido (RSF), em Cartum, a capital do país, e outras áreas do Sudão. Segundo agências de notícias, até ontem, 17, pelo menos 97 pessoas morreram desde quando a violência se intensificou. Muitas pessoas, incluindo profissionais de saúde, atualmente não podem se movimentar. Relatos da organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF) descrevem a situação como terrível. O conflito já estava em curso há semanas, impedindo qualquer solução política em um país que desde 2019 está tentando organizar as primeiras eleições livres após 30 anos de ditadura islâmico-militar.
Nesta fase, é impossível saber quem está no controle da situação. A China, muito presente no país, rico em reservas de petróleo, está seguindo de perto os acontecimentos e convida que “os dois lados cessem os confrontos o mais rápido possível e evitem a escalada das tensões. Esperamos”, escreve em comunicado o Ministério das Relações Exteriores da China, “que as partes no Sudão aumentem o diálogo e realizem conjuntamente o processo de transição política”.
Desde o acirramento das hostilidades, MSF recebeu um total de 136 pacientes feridos no hospital que apoia em El Fasher, no norte de Darfur – 11 morreram devido aos ferimentos.
“A maioria dos feridos é de civis que foram atingidos no fogo cruzado – entre eles, muitas crianças”, disse Cyrus Paye, coordenador do projeto de MSF em El Fasher.”Eles têm ferimentos extremamente graves e, até sábado à tarde, não havia capacidade cirúrgica neste hospital. Todos os outros hospitais no norte de Darfur tiveram que fechar – seja devido à proximidade com os conflitos ou porque os funcionários não conseguiam chegar às instalações por causa da violência. Por isso, não havia lugar para encaminharmos os pacientes para tratamento. Como consequência, 11 pessoas morreram devido aos ferimentos nas primeiras 48 horas de conflitos”, lamentou.
O conflito
Localizada na África, a República do Sudão, ou simplesmente Sudão, é, desde 1956, um país que faz fronteira com o Egito (ao norte), a Eritreia, a Etiópia e o Mar Vermelho, por onde se limita com a Arábia Saudita (a leste), pelo Sudão do Sul (ao sul) e pela República Centro-Africana, Chade e Líbia (a oeste).
Desde a saída do presidente Omar al-Bashir, em 2019, o país vem atravessando uma onda de instabilidade política. Um governo conjunto entre civis e militares foi anunciado em 2019, mas o arranjo foi desfeito com um golpe militar em outubro de 2021, liderado por Abdel Fattah al-Burhan e Mohamed Hamdan Dagalo, líderes militares que hoje se enfrentam. Al-Burhan é, hoje, o líder do exército e, na prática, do país. Dagalo comanda as Forças de Apoio Rápido (RSF), um grupo paramilitar muito atuante na região de Darfur. As RSF vêm com desconfiança sua integração às Forças Armadas Sudanesas. Esse tem sido um dos pontos de desentendimento entre os dois lados. Com isso, um acordo político obtido em fevereiro deste ano, depois de meses de negociação, fracassou.
Por toda a capital Cartum, homens de uniforme e armas em punho circulam pelas ruas vazias de civis, enquanto colunas de fumaça sobem do centro da cidade, onde estão localizadas as principais instituições de poder. Tiros de artilharia também aconteceram em Kassala, na região costeira oriental do país. As Forças de Apoio Rápido declararam em redes sociais que foram atacadas por “aeronaves estrangeiras” em Porto Sudão.
O Sudão já era um dos países mais pobres do mundo antes do início do conflito, com um terço da população necessitando de assistência humanitária e enfrentando fome aguda.